quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Tragédia Santa Catarina - Para lembrar

Recebi este e-mail hoje, e, como as cidades, meus olhos se encheram de água. Tanto a ser feito e tão pouco eu fiz.
Quem dera as águas de lá pudessem ser secas tão facilmente como meus olhos.
Mas o Sol da Justiça secará toda água, seja de rios, seja de lágrimas.
Eis o e-mail, para lembrar ...



Meus amigos,
Hoje 27 de novembro de 2008 o sol saiu e conseguimos voltar a trabalhar. A despeito de brincadeiras e comentários espirituosos normais sobre esta "folga forçada" a verdade é que nunca me senti tão feliz de voltar ao trabalho. Não somente pelo trabalho, pela instituição e pela própria tranqüilidade de ter aonde ganhar o pão, mas também por ser um sinal de que a vida está voltando ao normal aqui na nossa Itajaí.
As fotos que circulam na internet e os telejornais já nos dão as imagens claras de tudo que aconteceu então não vou me estender narrando e descrevendo as cenas vistas nestes dias.
Todos vocês já sabem de cor. Eu quero mesmo é falar sobre lições aprendidas.
Por mais que teorias e leituras mil nos falem sobre isso ainda é surpreendente presenciar como uma tragédia desse porte pode fazer aflorar no ser humano os sentimentos mais nobres e os seus instintos mais primitivos. As cenas e situações vividas neste final de semana prolongado em Itajaí nos fizeram chorar de alegria, raiva, tristeza e impotência. Fizeram-nos perder a fé no ser humano num segundo, para recuperar-la no seguinte. Fez-nos ver que sempre alguém se aproveitará da desgraça alheia, mas que também é mais fácil começar de novo quando todos se dão as mãos.

Que aquela entidade superior que cada um acredita (Deus, Alá, Buda, GADU etc.) e da forma que cada um a concebe tenha piedade daqueles:
- Que se aproveitaram a situação para fazer saques em Supermercados, levando
principalmente bebidas e cigarros

- Que saquearam uma farmácia levando medicamentos controlados, equipamentos e cofres e destruindo os produtos de primeira necessidade que ficaram assim como a estrutura física da mesma.
- Que pediam 5 reais por um litro de água mineral.
- Que chegaram a pedir 150 reais por um botijão de gás.
- Que foram pedir donativos de água e alimentos nas áreas secas pra vender nas áreas alagadas.
- Que foram comer e pegar roupas nos centros de triagem mesmo não tendo suas casas atingidas.
- Que esperaram as pessoas saírem das suas casas para roubarem o que restava.
- Que fizeram pessoas dormir em telhados e lajes com frio e fome para não ter suas casas saqueadas.
- Que não sentiram preocupação por ninguém, algo está errado em seu coração.
- Que simplesmente fizeram de conta que nada acontecia, por estarem em áreas secas.
Da mesma forma, que essa mesma entidade superior abençoe:
- Aqueles que atenderam ao chamado das rádios e se apresentaram no domingo no quartel dos bombeiros para ajudar de qualquer forma.
- Os bombeiros que tiveram paciência com a gente no quartel para nos instruir e nos orientar nas atividades que devíamos desenvolver.
- A turma das lanchas, os donos das lanchinhas de pescarias de fim de semana que
rapidamente trouxeram seus barquinhos nas suas carretas e fizeram tanta diferença.
- À equipe da lancha, gente sensacional que parecia que nos conhecíamos de toda uma vida.
- Aos soldados do exército do Paraná e do Rio Grande do Sul.
- Aos bravos gaúchos, tantas vezes vitimas de nossas brincadeiras que trouxeram caminhões e caminhões de mantimentos.
- Aos cadetes da Academia da Polícia Militar que ainda em formação se portaram com veteranos.
- Aos Bombeiros e Policias locais que resgataram, cuidaram , orientaram e auxiliaram de todas as formas, muitas vezes com as suas próprias casas embaixo das águas.
- Aos Médicos Voluntários.

- Às enfermeiras Voluntárias.

- Aos bombeiros do Paraná que trabalharam ombro a ombro com os
nossos.
- Aos Helicópteros da Aeronáutica e Exercito que fizeram os resgates nos locais de difícil acesso.
- Aos incansáveis do SAMU e das ambulâncias em geral, que não tiveram tempo nem pra respirar.
- Ao pessoal do Helicóptero da Polícia Militar de São Paulo, que mostrou que longo é o braço da solidariedade.
- Ao pessoal das rádios que manteve a população informada e manteve a esperança de quem estava isolado em casa.
- Aos estudantes que emprestaram seus físicos para carregar e descarregar caminhões nos centros de triagem.
- Às pessoas que cozinharam para milhares de estranhos.
- Ao empresário que não se identificou e entregou mais de mil marmitex no centro de triagem.
- A todos que doaram nem que seja uma peça de roupa.
- A todos que serviram nem que seja um copo de água a quem precisou.
- A todos que oraram por todos.
- Ao Brasil todo, que chorou nossos mortos e nossas perdas.
- Aos novos amigos que fiz no centro de triagem, na segunda-feira.
- A todos aqueles que me ligaram preocupados com a gente.
- A todos aqueles que ainda se preocupam por alguém.
- A todos aqueles que fizeram algo, mas eu não soube ou esqueci.

Há alguns anos, numa grande enchente na Argentina um anônimo escreveu
isto:

COMEÇAR DE NOVO
Eu tinha medo da escuridão
Até que as noites se fizeram longas e sem luz
Eu não resistia ao frio facilmente
Até passar a noite molhado numa laje
Eu tinha medo dos mortos
Até ter que dormir num cemitério
Eu tinha rejeição por quem era de Buenos Aires
Até que me deram abrigo e alimento
Eu tinha aversão a Judeus
Até darem remédios aos meus filhos
Eu adorava exibir a minha nova jaqueta
Até dar ela a um garoto com hipotermia
Eu escolhia cuidadosamente a minha comida
Até que tive fome
Eu desconfiava da pele escura
Até que um braço forte me tirou da água
Eu achava que tinha visto muita coisa
Até ver meu povo perambulando sem rumo pelas ruas
Eu não gostava do cachorro do meu vizinho
Até naquela noite eu o ouvir ganir até se afogar
Eu não lembrava os idosos
Até participar dos resgates
Eu não sabia cozinhar
Até ter na minha frente uma panela com arroz e crianças com fome
Eu achava que a minha casa era mais importante que as outras
Até ver todas cobertas pelas águas
Eu tinha orgulho do meu nome e sobrenome
Até a gente se tornar todos seres anônimos
Eu não ouvia rádio
Até ser ela que manteve a minha energia
Eu criticava a bagunça dos estudantes
Até que eles, às centenas, me estenderam suas mãos solidárias
Eu tinha segurança absoluta de como seriam meus próximos anos
Agora nem tanto
Eu vivia numa comunidade com uma classe política
Mas agora espero que a correnteza tenha levado embora
Eu não lembrava o nome de todos os estados
Agora guardo cada um no coração
Eu não tinha boa memória
Talvez por isso eu não lembre de todo mundo
Mas terei mesmo assim o que me resta de vida para agradecer a todos
Eu não te conhecia
Agora você é meu irmão
Tínhamos um rio
Agora somos parte dele
É de manhã, já saiu o sol e não faz tanto frio
Graças a Deus
Vamos começar de novo.

Anônimo

É hora de recomeçar, e talvez seja hora de recomeçar não só materialmente. Talvez seja uma boa oportunidade de renascer, de se reinventar e de crescer como ser humano.
Pelo menos é a minha hora, acredito. Que Deus abençoe a todos.

Luis Fernando Gigena

domingo, 30 de novembro de 2008

Minha Princesa

Hoje, dia 27/11/08, olhei para minha filha e sonhei...

Tornei o futuro, presente, e,

como presente, entrego-o:

"Um dia, princesa, você assumirá seu trono.

Anseio participar desse dia em que suas decisões não mais serão apenas as minhas, mas, principalmente, melhores.

Para esse momento guardo presentes que pouco a pouco tenho tentado lhe repassar ao longo dos anos, e que, agora, são seus por direito.

Conquistados no armistício já há muito idealizado na sua alma sempre pacífica, pois os pacificadores, filhos do Soberano Maior, é que têm a herança garantida.

E é por causa do Soberano que me tornou rei e me concedeu a graça de cuidar de você, princesa, que hoje repasso por completo os preentes que um dia Ele me entregou para que você faça pleno e perfeito uso deles.

Primeiro, o Trono da Sabedoria. Porém, cuide para colocá-lo sempre abaixo e no curso do Rio da Vida.

Aqueles que tentaram usurpar a Sabedoria não tiveram vida proveitosa, pois a Verdadeira Sabedoria é gratuitamente concedida ao que a ela se sujeitam.

Segundo, o Manto da Santidade.

Vista-se sempre com ele. O manto nos ajuda a compreender que a Santidade não está em nós, mas foi a nós concedida, nos foi imputada, nos é dada para vestir. Sem a veste que nos foi dada somos nús, pobres e cegos. É esse manto que nos torna honrados e nos faz ver quem realmente somos diantes do Soberano, e nos faz ver ainda o Seu Amor que, mesmo Santo, veste a nós que não o somos.

O terceiro presente é o Cetro da Graça.

Tenha-o sempre à mão e tenha seu braço sempre estendido, pois da mesma forma que o Soberano nos tocou com Sua Graça antes de nos abraçar, seja esse seu agir com todos aqueles que se aproximarem de você e em todos os seus atos, sabendo que ainda hoje, e sempre, o soberano continua assin agindo.

Por fim, entrego minha vida como seu presente. Meu intento até hoje foi o de servir você, princesa, para que um dia se tornasse uam rainha honrada.

Este dia chegou. Quero continuar sendo um degrau para lhe manter mais próxima de nosso Soberano de onde você poderá receber tudo de que necessita para viver e reinar como convém: para glorificar o nome de Deus."

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Ed René Kivitz - Palestra

Eis o link para uma mensagem do Ed René Kivitz no encontro da SEPAL em 2006.

É sobre a maneira como Deus ensina o profeta a apresentar a mensagem. Deus faz o profeta sentir um vislumbre do que Ele sente para poder expressar de alguma forma aquilo que Deus quer dizer. No final, o que importa é o sentimento repassado e as palavras nunca conseguem expressar toda a realidade desse sentimento.

Muito bom!!!

http://video.google.com/videoplay?docid=8023602411255104835&ei=twq4SIb3KpSurgKy5vXeDA&q=%22ed+ren%C3%A9%22&hl=en

Vale complementar com esse documentário sobre "A História das Coisas" que recebi do irmão do André Egg, o Ricardo:

http://video.google.com/videoplay?docid=-3412294239230716755&hl=en

Só para ressaltar, hoje (29/08/08), encaminhei os dois vídeos por e-mail para todos da PRT9 com as seguintes mensagens:

Para o vídeo "A História das Coisas":
"Caros colegas:
Invado suas caixas postais para recomendar que assistam em casa o esclarecedor vídeo abaixo.
Quem sabe poderemos ser conhecidos como a geração que participou de uma mudança consciente em nosso planeta!
Afinal, não há vida sem lugar para viver!
E não há lugar para viver sem pessoas que o mantêm!"

Para o vídeo do Ed René:
"Caros colegas:
Complementando o vídeo anterior, encaminho um outro vídeo para que vocês possam assistir em casa. Dessa vez, não é um vídeo estilo "Discovery Channel", mas uma palestra.
Se no vídeo anterior é possível compreender o agir horizontal do Homem em seus relacionamentos, neste, creio que temos alguns vislumbres de um agir vertical, o agir de Deus em nós, e, através de nós, sobre os que estão próximos de nós.
Em ambos os vídeos o que se ressalta é a possibilidade e a necessidade de mudanças em nossas estruturas não apenas sociais, mas, sobretudo, pessoais.
Prometo que hoje não encaminharei mais nenhum vídeo! :-)"

terça-feira, 29 de julho de 2008

Poesia - Mario Quintana

REPARA como o poeta humaniza as coisas:
dá hesitações às folhas, anseios ao vento.
Talvez seja assim que Deus dá alma aos homens...

Mário Quintana. (in Ricardo Gondim)

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Devocional - Felicidade

Ontem assisti ao filme Em Busca da Felicidade (ou aqui)e como já havia lido sobre isso no site do Ricardo Gondim e conversado com Nilson, Leandro e famílias em um jantar recente, bem como também tenho buscado a felicidade, passo a tecer alguns comentários para mim e àqueles que também a buscam.

Não acredito nessa história de me esforçar e chegar lá. Há mais variáveis não controláveis nesse meio que tornam o "chegar lá" quase que um acaso.
Também, não quero simplesmente vincular felicidade com dinheiro, status, ou qualquer coisa material. Não vejo o filme apenas dessa forma. Em várias partes o protagonista diz "esse momento de minha vida eu chamo de ...". E após ter conseguido o emprego, ele diz, "esse breve momento, eu chamo de felicidade."
Interessante que nossa busca da vida inteira seja apenas para desfrutar um breve momento de felicidade.
Logo após esse filme fiquei zapeando os canais e terminei por assistir ao final do filme Peixe Grande. Outro filme que apresenta uma interpretação sobre felicidade.

Impossível, ainda, nessa busca sobre felicidade, não se deparar com o que o Evangelho de Mateus indica ser a felicidade (Bem-Aventurança).
A grande questão, para mim, é que a felicidade que buscamos quase sempre está relacionada à satisfação pessoal (pessoal aqui em dois sentidos: minha e para mim).
Talvez seja por isso que a felicidade se torna tão breve.
Talvez seja por isso que ao 'acharmos' a felicidade ela desaparece de nossas mãos e voltemos a buscá-la no próximo monte que idealizamos subir.

Mas não pode ser assim.
Tudo bem que a dúvida faz parte de nós e temos de confirmar e reconfirmar as nossas certezas, mas a felicidade é algo que dificilmente dizemos ter encontrado, mesmo já dela tendo desfrutado.
Deve haver um modo de tornar a felicidade apartada das conquistas, interiorizá-la, fazê-la parte de nós e torná-la mais perene do que um breve momento.
Minha contribuição para tanto é, penso eu, melhor esclarecer felicidade definindo-a por contentamento.
Contentamento é entender sua vida como dádiva e graça, e, dessa forma, viver não mais olhando para si, mas desfrutando do que lhe foi concedido, do que já alcançou, e ao lado dos 'próximos' que estão próximos.
Não é deixar de sonhar e buscar (seja lá o que nos impulsiona a sonhar e buscar), mas, utilizando a fidelidade de Vinícios para expressar a felicidade, 'viver em cada vão momento, com seu pesar ou seu contentamento'.

Se a felicidade estiver vinculada à perfeição, à ausência de dor, ao pessoal (meu e para mim), então não há como ela não ser fugaz, não há como ela não ser uma eterna busca por breves momentos.

Não há, igualmente, como a felicidade não ser busca, mas deve ser um buscar achando, e um achando mais constantemente.
Ao perseguir a felicidade, ainda consigo aceitar a busca, e mesmo a brevidade do êxtase da felicidade, somente não consigo aceitar o perder a felicidade.

Jesus diz quem são os MAIS FELIZES (Bem-aventurados) (Mateus 5: 1-16).
Esses são os que buscam, mas a busca extrapola o pessoal (meu e para mim). Essa busca vai além da alegria pessoal, vai além da dor, vai além da própria vida como algo a que se deva apegar.
Os MAIS FELIZES são os que buscam e continuam buscando, e lhes são concedidos êxtases na busca que não lhes permitem parara de buscar, mas compreedem que já encontraram e que continuam encontrando e que o encontro perdura na vida e no tempo.
A busca da felicidade parece ser, enfim, a busca pela prática da doação, pela prática da existência pessoal no próximo. Não mais meu e para mim, mas, a existência do eu somente no dele e para ele.
O contentamento é compreender que o dele e para ele, que o próximo, não está tão longe nem é tão desconhecido assim, mas é o integrar-se à vida que vivemos de forma a perceber suas minúcias e se contentar (ficar contente, ficar feliz, bastar) na vida que se leva. Não é jamais 'deixar a vida me levar', mas integrar-se à vida para viver levando a vida e bastando para poder sonhar em levar vida e bastar-se aos próximos.
Henri Nouwen é um dos autores que gosto de citar nesse contexto.

Então, como no final do filme Peixe Grande, alcançamos nossa busca e nos tornamos aquilo que buscamos ao fazermos real nossa busca em cada vão momento para os outros.

Continuo a busca, mas com novas lentes, as quais têm me feito compreender que são MUITO FELIZES aqueles que buscam a felicidade na busca de contentamento real e para agora, não mais no pessoal mas essencialmente no próximal (dele e para ele).

terça-feira, 15 de julho de 2008

Indicação - ATRIBULAÇÕES DE UM CHINÊS FORA DA CHINA

ATRIBULAÇÕES DE UM CHINÊS FORA DA CHINA
João César das Neves
professor universitário
naohaalmocosgratis@fcee.ucp.pt

Honorável primo Chu Agradeço a carta e as notícias. Espero que tudo continue bem aí em Beijing. Como passa a tia Ma? Por cá as coisas andam prósperas. Com os estrangeiros daqui em crise, é bom para a nossa loja e restaurantes.Quanto às perguntas que me faz acerca dos ocidentais, tem toda a razão em estar preocupado com os Jogos Olímpicos que se aproximam. Tenha muito cuidado, porque os narizes compridos só dizem mentiras. Falam muito em liberdade e querem ensinar a todos o que ela é, mas só conhecem as liberdades que não interessam. Faltam-lhes as realmente importantes.Andam muito orgulhosos por poderem escolher os chefes e dizer mal deles. Como acham que nós não dizemos, consideram-nos oprimidos. Mas não têm liberdade para vender, comer, guiar, despejar lixo e mil outras coisas. É proibido fumar cigarros, cortar árvores, fazer barulho. Vendem só a certas horas e em certos sítios. Não se pode trabalhar à noite ou quando se é velho. Nem imagina o que eles exigem para se andar de carro (por exemplo, um colete verde!!). Proíbem muitas comidas, das nossas ou mesmo das que eles sempre comeram. Ficam fulos se não dividimos o lixo. Até querem controlar a maneira como se escreve. Tudo tem regras, imposições, limites. Sobretudo papéis. Muitos papéis. Chamam a isto progresso e liberdade.O Fu diz que a vida na terra dos narizes grandes é como a que tínhamos no tempo do Camarada Mao. Eu achava exagero (sabe como é o primo Fu...) mas um dia vi que tinha razão. Vieram ao restaurante alguns guardas vermelhos armados. Diziam ser fiscais da economia, mas senti aquele mesmo medo da revolução cultural. Viram tudo, inventaram multas por nada, ralharam e levaram preso o tio Deng.Como no tempo do Camarada Mao, os ocidentais passam horas em doutrinação política. Aqui é em frente à televisão. Um deles disse- -me que era muito diferente da China, porque não é doutrina, mas notícias e debates (exactamente como lhe chamavam os comissários do povo), e porque se pode escolher aquilo que se ouve. Ao princípio acreditei, mas depois vi que não há escolha. Todos dizem o mesmo. E querem eles ensinar-nos liberdade!Como vai ter narizes grandes em Beijing, precisa conhecê-los. Diz-se que só pensam em dinheiro, mas isso também nós. A diferença é que, além da tal liberdade, eles adoram três coisas: papéis, saúde e sexo. Quando aos papéis, já lhe expliquei: há papéis para tudo. Não sei se foi boa ideia termos-lhe dado essa nossa invenção. Depois andam sempre aterrorizados com a saúde. Gastam imenso dinheiro em médicos e remédios, mesmo quando não estão doentes. Para eles tudo -comida, sexo, trânsito, desporto- é um problema de saúde. Andam loucos com o corpinho. Depois morrem como toda a gente.Quando não é papéis ou médicos, é sexo. A coisa que mais os cega é sexo. Aqui as mulheres deles andam quase nuas na rua (cuidado com as primas!!). Cega-os porque não o entendem. O sexo deles não é para ter filhos, mas para vender sabonetes. Não é para ter família e ser feliz, mas para trair, zangar, ter sarilhos. Chamam-lhe liberdade, claro!Liberdade! Nem fazem ideia o que seja! Também não sabem o que é honra, respeito, dignidade. Escolhem os chefes (embora, como aí, os que mandam sejam sempre os mesmos), mas logo a seguir começam a dizer mal deles. Só querem a liberdade de criticar porque odeiam os chefes. Odeiam muito mais que nós. Nunca vi um povo odiar tanto. Quem diz pior do Ocidente são os jornais ocidentais (se ler o que dizem da China, farta-se de rir porque eles não sabem nada).Descobri um truque que lhe pode ser muito útil: nas discussões com eles é fácil pô-los a gritar entre si. Quando criticarem a política do filho único, diga-lhes que têm menos os filhos que nós. Se acusarem a pena de morte, acuse a eutanásia e o aborto. Se falarem no Tibete pergunte-lhes pelo Iraque. É que eles além dos chefes, odeiam o sistema (dizem sempre que está "podre"), odeiam a vida, odeiam-se a si mesmos. Este povo adora dizer mal de si próprio. Chamam-lhe liberdade.Saudades do primo Guo.

O crédito do achado é do André Egg.
O link da crônica é do Diário de Notícias de Portugal.